LGBT e política: ventos de mudança em Berlim

30 de junho de 2015 | Escrito por Filipe Teixeira | Autores convidados

por Débora Medeiros, de Berlim, Alemanha.

Sábado passado fui à Parada do Orgulho LGBT de Berlim pela primeira vez. Aqui e em várias cidades europeias, ela se chama Christopher Street Day, em alusão à rua onde fica o Stone Wall Inn, local histórico para o movimento LGBT.

A atmosfera era super relaxada e alegre, apesar do dia cinza. Muitos carros alegóricos tocavam clássicos à la “I Will Survive”, stands vendiam junk food e cerveja, todo mundo dançava com todo mundo, tirava selfies, sorria. Acho que nunca tinha dançado com tantos caras sem camisa na vida – e o melhor: sem levar cantadas sem graça.

No entanto, o que mais me chamou a atenção foi a forte presença de temas políticos, um lembrete quanto às origens desses eventos em todo o mundo e aos direitos ainda por conquistar também aqui na Alemanha. Vi carros alegóricos de pelo menos três dos maiores partidos do país: os Verdes (Bündnis 90/Die Grünen), aliados históricos na luta pelos direitos das minorias, os sociais-democratas do SPD e os conservadores da União Democrata-Cristã (CDU), partido da chanceler Angela Merkel – o pessoal nesse último carro exibia o adesivo “A trupe gay da Mamãe”, numa alusão ao apelido da Merkel aqui (Mutii). Companhias como a Siemens, além das embaixadas da Grã-Bretanha e do Canadá, também marcaram presença, ao lado de movimentos sociais e organizações da sociedade civil.

Após o referendo na Irlanda e a decisão do Supremo Tribunal dos EUA, o debate em torno do casamento igualitário ganhou ainda mais força por aqui também. A Alemanha aprovou a união civil já em 2001, mas, como até recentemente no Brasil, ela não inclui alguns dos direitos que o casamento oferece. Além disso, casais do mesmo sexo ainda não podem adotar, exceto quando a criança é filha biológica de um dos parceiros.

Para tentar mudar esse quadro, diversas entidades LGBT se uniram em torno do movimento Casamento para Todos, exigindo que os parlamentares votem – e aprovem – o casamento igualitário, que já está em discussão há mais de 15 anos. De acordo com pesquisas de opinião recentes, dois terços dos alemães são a favor da medida.

LGBT

Foto: Fabian Böttcher

No dia a dia, dá pra perceber essa postura liberal. Berlim é uma das cidades mais gay-friendly da Europa, com muitos bares, cafés e iniciativas para o público LGBT. Não se ouvem piadinhas homofóbicas por aí, nem nas ruas nem na imprensa. Até pouco tempo atrás, nosso prefeito era o Klaus Wowereit, abertamente gay.

Claro que nem tudo é perfeito: no estado de Baden-Württemberg, 192 mil pessoas assinaram uma petição on-line contra a inclusão de temas relativos à diversidade sexual no programa escolar estadual, e muitos gangsta rappers ainda povoam suas letras de termos homofóbicos. No entanto, muitos outros estados, como Bremen, Berlim, Nordrhein-Westfalen e Rheinland-Pfalz já incluem o respeito à diversidade nos seus planos escolares – e os rappers homofóbicos têm sido cada vez mais criticados, inclusive na própria cena.

Então, por que o casamento igualitário ainda não é uma realidade por aqui? Muitos atribuem isso ao fato de os conservadores estarem no poder há tanto tempo (Merkel já governa há 10 anos), mas, devagarzinho, mesmo políticos do CDU têm se posicionado a favor do casamento igualitário. Os ventos da mudança têm soprado cada vez mais fortes em Berlim e não deve demorar muito mais até que o casamento seja mesmo para todos. Se até os EUA conseguiram, por que a Alemanha não conseguiria, né?

Débora Medeiros é formada em Comunicação pela UFC (Universidade Federal do Ceará) e hoje mora em Berlim, onde fez seu mestrado em Mídia e Comunicação política e hoje cursa o doutorado em Comunicação. Para conhecer mais sobre a Débora, clique aqui. A foto de capa é também de Fabian Böttcher.

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Escrito por Filipe Teixeira

Escritor amador e ansioso profissional.