As quatro estações

19 de dezembro de 2014 | Escrito por Filipe Teixeira | Diário de viagem

Uma coisa que sempre me frustrou foi estudar as quatro estações na escola e não ver a coisa acontecendo de verdade. Dizer a uma criança que no outono a folha fica amarela e cai da árvore sabendo que isso não vai acontecer é sacanagem. Deve ser até pecado em alguma religião. Digo isso porque sou de Fortaleza, e lá temos apenas a estação seca e a chuvosa, ambas quentes e nada de folhinha amarela caindo das árvores. Só experimentei as quatro estações mais ou menos definidas quando cheguei a Portugal. E foi assim que as assimilei:

Outono

quatro estações

Cheguei a Lisboa no auge do verão, em julho. Mas, acostumado com o calor de Fortaleza, o daqui não fez muita diferença na minha percepção. Mas aí, lá pro começo de outubro, o ar começou a esfriar e o casaco que eu trouxe de Medellín passou a não significar muita coisa por aqui. Houve uma noite em que eu acordei sem fôlego e, quando me apercebi, estava debaixo dos dois edredons. Eu nunca faço isso, mas o frio estava tão intenso (para os meus padrões) que eu me cobri inconscientemente. Não consegui mais dormir, fiquei naquele transe. No dia seguinte, comprei um aquecedor movido a desespero. A contrapartida é a lindeza dessa estação. Poucas coisas são tão bonitas quanto uma árvore no outono, quando as folhas secam e vão caindo, uma a uma, colorindo os caminhos.

Inverno

quatro estações

O inverno aqui em Portugal, se comparado com países mais ao norte da Europa, é ameno. Mas quando seus últimos 27 anos foram vividos em uma cidade próxima à linha do Equador, a sensação é bem mais intensa. Segundo o Frejat, quem dorme de meia vira burguês, então aqui eu entrei pra linha de frente da burguesia, porque há certas noites em que não dá pra dormir com os pés desagasalhados ou sem o edredom e o aquecedor, sempre ligado. Além disso, o inverno traz várias mudanças de hábito, principalmente na maneira de se vestir. Uma simples ida ao supermercado exige meia, tênis (a não ser que você ande de pantufas por aí), calça e casaco. O que me encanta, particularmente, são os dias de cerração, quando o horizonte desaparece e o que se vê é apenas aquele misterioso ar denso e branco à frente.

Primavera

quatro estações

Por mais que as paisagens e o clima das estações anteriores me agradem bastante, quando nasce a primeira flor da primavera e as árvores começam a ganhar suas folhas de volta, é inevitável sentir uma certa alegria. E não são apenas as árvores que renascem, é possível perceber a renovação do humor das pessoas, que é refletido até no tom das roupas, mais claros do que nos meses anteriores. Os dias começam a ficar mais longos, depois de três meses anoitecendo às cinco, cinco e meia da tarde, e o aquecedor passa a ser desnecessário. As atividades ao ar livre ganham espaço novamente e usamos cada vez menos camadas de roupa.

Verão

quatro estações

Depois do meu primeiro ano em Lisboa, percebi que passei a medir o tempo pelas estações. Expressões como “no inverno passado” e “quando chegar o verão” tornaram-se frequentes no meu repertório, porque assim também se divide o ano, não só em meses. Com o verão, chega uma sensação de liberdade, que eu considero existir por dois fatores: a) a leveza das roupas e b) os dias longos. Não são mais necessários casacos, jaquetas, gorros e cachecóis, bermuda e camiseta já resolvem. E, quando saio do trabalho, às seis, e só dali a três horas vejo o sol se pôr, a impressão é a de que trabalhei menos tempo. A contrapartida disso tudo é o calor. Comprei um ventiladorzinho movido por um desespero tão intenso quando o que me fez comprar o aquecedor meses antes. Em 2013, foram vários os dias em que a temperatura atingiu os 40°. Este ano foi mais ameno, mas ainda assim houve dias bem quentes, principalmente na iminência do outono, mas nada que várias cervejas não tenham resolvido.

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Escrito por Filipe Teixeira

Escritor amador e ansioso profissional.