O ataque terrorista em Paris, por uma brasileira

15 de novembro de 2015 | Escrito por Filipe Teixeira | Autores convidados

por Greice Nascimento, de Paris, França

Nós estamos bem. Não saímos de casa na noite de sexta-feira. A única coisa que ouvíamos era o barulho das sirenes e, uma vez, o som de um helicóptero. As ruas se esvaziaram rapidamente após as notícias. Pela primeira vez vi o Bellevilloise (uma bar famoso aqui da rua) completamente vazio em um dia que seria de festa.

Estávamos todos em alerta, os próximos que também vivem em Paris, em uma corrente de mensagens, perguntavam-se se estavam bem, se estavam fora de risco. E, felizmente, nos encontravamos em segurança. Foi decretado um alerta à cidade: “não saiam às ruas, o perigo é constante”. O alvo poderia ser qualquer um, inclusive um árabe, que não se veste como a gente e que vive nessa cidade.

Os responsáveis pelo ataque terrorista: o Estado Islâmico. A ação é uma represália ao envolvimento da França na guerra contra o terrorismo e, principalmente, uma resposta à ação do Estado francês, ocorrida no dia 27 de setembro deste ano. É um momento que me entristece, como também me entristecem os comentários preconceituosos que se iniciam aqui: “culpa da política de acolhimento a refugiados”, “medo dos muçulmanos”, “culpa da liberdade religiosa”…

Quanto a esses pensamentos, é importante neste momento esclarecer que os refugiados sírios estão fugindo de uma guerra civil que acontece em seu país desde 2011. Ou seja, tanto eles quanto nós estamos no mesmo barco. Só que eles (como vimos nos noticiários, quando lemos sobre a situação em todas as mídias, depois da comoção geral com o garoto sírio morto no mar da Turquia), vêm de uma situação caótica. Com base nisso, será que nos cabe falar de culpa dos refugiados?

Outro ponto: quando falamos de Estado Islâmico, nos referimos a um governo religioso. Nesse governo, não se fala em liberdade religiosa. E liberdade religiosa é o que entendemos por liberdade de culto, tanto para católicos, como judeus, muçulmanos, protestantes, candomblecistas e por aí vai. Condenar liberdade religiosa é um ato equivocado.
O que se condena aqui é um Estado fundamentalista religioso, cuja administração se dá pelo uso de razões religiosas.

O Estado srancês é laico, mas comporta a liberdade religiosa. Por isso há tantos muçulmanos nas ruas com seus trajes típicos, por isso há mesquitas aqui também para que eles possam exercer sua liberdade de culto, da mesma forma há tantos judeus de quipá nas ruas e muitas sinagogas pela França; como há inúmeras igrejas católicas, para que a gente possa ir à nossa igreja expressar a nossa gratidão ao nosso Deus cristão.

Cultivar um certo medo de muçulmanos em Paris é algo que, além de preconceituoso, não ajuda muito, já que Paris é uma cidade metropolitana com inúmeros imigrantes e, dentre eles, muitos, muitos, mas muitos (!!!) muçulmanos. É quase impossível não cruzarmos pelo menos com um deles no metrô, seja jovem ou mais velho.

Se eu tenho medo de andar no metrô com esses novos ataques sem alvos específicos? Óbvio que sim, não é mesmo?! Já tinha bem antes, por conta dos ataques aos jornalistas do Charlie Hebdo. É claro que estou triste pelas vítimas, todas elas, e pelas suas famílias. Certamente estou apreensiva pela vida de todos que habitam Paris, pois todos correm perigo.

Mas, apesar de tudo – do medo e do terror, de saber que todas as ações foram provocadas por um Estado religioso –  não posso dar cabo a pensamentos preconceituosos, não posso deixar que o ódio me leve a condenar ainda mais muitos árabes e muçulmanos que vivem nesta cidade e que nada têm a ver com os ataques.

A campanha nas redes é #PrayForParis, e isso quer dizer que devemos estamos abertos para aceitar todas as preces, não?

*Foto de capa: Kenzo Tribouillard

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Escrito por Filipe Teixeira

Escritor amador e ansioso profissional.