Carta de gratidão a Cingapura

24 de julho de 2015 | Escrito por Rafael Feltrin | Diário de viagem

Um ano, 2 meses e 3 dias. Foi o tempo que te amei, Cingapura. Te odiei também, mas somente quando o metrô chegava. Você me fez chorar, mas somente quando a fé no meu taco balançava – fazia parte do amadurecimento. E quando a saudade ardeu feito boldo, eu só tinha olhos para o que você me oferecia – e sorri. Você me abraçou apertado e me deu uma visão tão bonita  do mundo, de presente. Me deu Stella, uma mãe que me acolheu e afirmou me conhecer de outras vidas; me deu Chantel, uma irmã que se apegou a mim feito sentimento de proteção; meu deu Naty, que abanava o rabo e me olhava todos os dias, dizendo: “você sempre será bem-vindo à nossa casa, pois você já é parte dela. Só não esqueça de passear comigo todas as noites, pois eu confio em você”. Me deu minha liberdade – a quem jurei todo o meu amor. Me deu uma porção de gente, gente importante que tranquei no peito, que fosse para jamais sair de lá. Gente que palavra nenhuma define, que a gente só sente, se apega, adora.

Cingapura

Você me mudou, tirou de mim algumas cores. Me deu outras. Me ensinou o que é respeito, aprendi o que é preconceito. E foi feio, doeu. Você me deu coragem, me fez matar um leão por dia. Um de cada vez, todas as vezes que eu caminhava ouvindo alguma música e sentia um quase choro rasgado na garganta, pela vitória, pelo fracasso, pela saudade, pelos tombos. Mudei de profissão e me desafiei – mesmo nas vezes em que isso não fosse necessário – depois, mudei de novo. E então saí a galope, atrás de sonhos que fugiam de mim sempre que eu acordava. Me abri, me coloquei no mundo, cumprimentei gente cujo nome nunca soube. Mas também conheci gente de quem jamais vou me esquecer, não importa quantas curvas a vida me dê. Você me deu um ano que me foi como década. Assim, cheio de vida, lugares, aventuras, fotos e muitos contos. Contos que joguei aqui e ali, porque a excitação era tamanha que não cabia em mim. Então precisava espalhar por aí, como se diz, “por favor me acorde, que não acredito que seja assim real tudo isso aqui”.

Eu voei para você com duas malas, uma mochila nas mãos e, até hoje, quando minha lembrança te encontra, saio com uma vida inteira dentro de mim. Me joguei a você com o coração um tanto ingênuo e salivando paixão. Deixei ao vento minha sanidade e me fui, assim como areia no vendaval. Sem pedir, sem expectativa alguma à vista, você me encheu de beleza e sorte. Sentei na borda daquele lagos fluorescentes, e meu coração – nem minha inspiração – não aguentou. Era tanta beleza que por um instante não me senti digno de ver. No meio de tantas almas pobres espalhadas pelo mundo, eu estava ali. Então eu agradeci. Fechei meus olhos e agradeci.

Cingapura

Deixei você com o coração cheio. Completo. Dei tudo de mim a você e você me deu de tudo em troca. Justo. Você me fez maestro, me fez mais forte, mesmo diante dos meus últimos momentos por aí. E fui obrigado a respirar fundo para ler o cartão de despedida que a minha Chantel havia deixado, onde encerrava em conselhos aos quais farei jus para sempre. Me encontrou todas as vezes que me perdi por aí; assim me despedi de você, Singapore. Mas levo comigo um pedaço muito bonito, de cada cantinho que voei ao seu redor, de cada sol que vi, de cada pedacinho de terra que pisei, que toquei. E deixei parte de mim. Justo, muito justo.

Obrigado. Muito obrigado.

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Escrito por Rafael Feltrin

Tenta ser legal, mas roubava Tazos na 5ª série.