A libido brasileira para além das fronteiras

9 de março de 2015 | Escrito por Juliana Santiago | Diário de viagem

Este não é mais um texto sobre os estereótipos carnavalescos, passistas de escolas de samba, supervalorização dos corpos ou sobre o erotismos que trafega cíclico da mídia para o povo e do povo para a mídia no Brasil. Menos ainda um texto teórico propondo discutir o conceito psicanalítico libido atrelado à cultura do país tropical. Vem, sim, de um olhar brasileiro, que foi deitando-se lentamente sobre sua própria nação, costumes e cultura ao mirar-se de longe e ao conhecer seu próprio povo para além das fronteiras brasileiras. De fora: de si e dos seus.

O brasileiro é um erótico. E não o é só o de academia, só as rainhas da bateria, só os que almejam a fama através dos seus corpos. Não é só o dinheiro, o Carnaval ou a mídia que nos ergue a fama de pessoas excitantes. Esses meios difundem o que é nosso e explora-o, numa retroalimentação constante, daí não sermos lá tão vitimizados assim.

Não somos eróticos apenas por apreciarmos beleza física, nem pelo tamanho dos biquínis ou pelas depilações artísticas na genitália. Nosso erotismo não é apenas essa naturalidade com que lidamos com a nudez na televisão. Talvez toda essa conduta só materialize – a grosso modo – o nosso verdadeiro sex appeal.

libido brasileira

O impulso da fala, o sem-medo do toque, o farejo dos hormônios, a vontade de se relacionar. É daí que brota genuinamente o que salta aos olhos em forma de símbolos: a libidinosidade “luso-afro-américo-europeia-tupi-guarani”.

A carência fumegante e a cálida paixão por trocar-se com a vida fazem o povo brasileiro viajar, descobrir mundos, conquistar espaços. Uma simpatia feromônica emana da nossa gente quando ela salta fronteira afora. Basta dizer a nacionalidade que os semblantes estrangeiros se enchem de fraternal alegria, abrindo portas por onde quer que passemos.

-“Brasileiro! Neymar! Ronaldo! Samba!”. Pronto. Fomos aceitos.

Do primeiro contato até que nos notem a libido desassossegada falta pouco – mesmo porque é bastante comum a predisposição para relações afetivas aumentar quando estamos fora da nossa zona de conforto.

Percebi essa disposição dos brasileiros para os relacionamentos – com a força que me inspira a escrever hoje – aqui, na Ásia. A trabalho, viemos 54 brasileiros de diversas partes do Brasil. Em pouco menos de duas semanas, o primeiro casal já estava formado. O primeiro de uma frenética cadeia de brasileiros que iniciariam relações afetivas intragrupo, ou seja, uns com os outros. Após três semanas, outro casal. Depois, festas, encontros, conversas. E mais um casal. Mais dois. Nisso, o primeiro deles já estava morando junto. O outro só ficou. Um terceiro ficou por um mês. O outro noivou. E assim foi, até que a maioria de nós compôs a atual conjuntura definida por casais, ex-casais e casuais casais.

libido brasileira

Há também os brasileiros e brasileiras que se relacionam com pessoas de outras nacionalidades aqui, em território estrangeiro. Há os que voltaram para o Brasil noivos. Tudo movido por esse jeito e por essa gana…

Se, por um lado, essa sensualidade e afetividade (que muitas vezes começa com uma intenção e termina com outra) nos são características marcantes; por outro, nos revela a carência, que, com o passar dos dias, fica sem critério. E, às vezes, até sem escrúpulo. Dado o afã de ter a atenção, de ser especial, o que começa sendo um discurso do brasileiro viajante de “ah, se rolar, rolou, né!”, passa a ser uma busca e termina sendo uma necessidade, dessas tão latentes que não veem beleza, atributos físicos, estado civil, delegando a escolha do novo affair para o excesso de bebida.

Outro efeito colateral dessa libido é a malícia. Pensar que uma pessoa se aproxima porque quer alguma coisa, e se nos elogia é porque quer nos beijar. E se nos olha é porque quer nos ter. As pontas extremas da libido brasileira: carência e narcisismo. E isso fora do país, tem um plus.

A libido – ainda que não intencionalmente – internacionaliza-se quase cerzida à bandeira. E esse é mais um presente que recebemos ao lançarmo-nos no mundo: uma maior percepção de si e do nosso povo a partir dos múltiplos olhares que encontramos nessa jornada.

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Escrito por Juliana Santiago

Nunca comprou melhorias no Candy Crush.