Eu não acredito em bruxas, mas que elas existem, existem

8 de janeiro de 2012 | Escrito por Filipe Teixeira | Diário de viagem, Oreo - Eu na Colômbia

Meu assento no voo entre Brasília e Cidade do Panamá era o 29A. Isso significa que era a última cadeira do lado da janela esquerda. Isso significa também que, se no meio do avião, que é estável, você se sente numa Topic atrasada, imagina no fundo! Pois balançou – e muito. Vou tentar não mais reclamar de decolagens aqui, mas são minutos de terror difíceis de esquecer, principalmente se você está no assento 29A. Some-se a isso o medo todo que o Dyego me fez ao falar das companhias aéreas latino-americanas. Mas vamos lá.

O Fuso

Na passagem dizia que o voo sairia às 6h41 de Brasília e chegaria à Cidade do Panamá às 9h48, haveria uma conexão e então sairia da Cidade do Panamá às 11h44, chegando a Medellín às 13h05. Eu, na minha inocência aeroportuária, pensei que esses horários eram de Brasília, mas não, eram os horários locais. Como no Panamá o fuso horário é de -5 e em Brasília de -3, mais uma hora do horário de verão, dá uma diferença de três horas. Ou seja, 9h48 da manhã na Cidade do Panamá equivalem a 12h48 no horário de Brasília, portanto o voo que na minha cabeça duraria três horas, durou, na verdade, seis. E eu acabei dormindo. Minha avó disse que eu não dormisse no avião “pra não correr o risco de passar da parada”, e por um momento eu achei que isso pudesse ter acontecido, mas depois lembrei que jamais seria possível eu dormir numa decolagem e percebi que estava demorando por causa do fuso horário e não porque eu tinha “passado da parada”.

O Caribe

Quando definitivamente acordei, o avião já estava naquela de descer um pouco, me matar de susto, me dar um tempo pra me recobrar e achar que está tudo bem, descer mais um pouco, me matar de novo e assim sucessivamente. Nesse momento, passando novamente pelas nuvens e aproximando-se do chão, vi  algumas ilhas caribenhas. Que coisa linda! Mas antes que eu me concentrasse na beleza da paisagem, lá vinha outro solavanco ou uma curva demasiado assustadora do avião.

O Pouso

A melhor parte de um voo de avião é o pouso, porque não há sensação melhor do que sentir-se preso à Terra pela gravidade. Mas o pouso na Cidade do Panamá foi digno do brinquedo mais visitado do Universal Park, parecia que o piloto estava brigando com o co-piloto: pousa agora – agora não – vai, agora… Mas finalmente pousamos. E eu, oficialmente, estava fora do país.

La Salsa

Já tinha ouvido sobre a quentura que é a América Central, mas nunca imaginei que seria tão quente dentro da sala de embarque. Passei duas horas esperando o momento de embarcar escutando as pessoas falando em espanhol – o que é estranho em um primeiro momento -, crianças chorando – várias delas, inclusive – e salsa o tempo todo, desde o momento em que eu pisei no aeroporto até o momento em que entrei no avião. Tudo isso sem internet, porque não sabia como perguntar a senha. E eu não sou de perguntar. Se eu souber, beleza, se não, não.

Murphy no Panamá

O avião estacionou e ficou olhando para mim como que sorrisse e dissesse “Entra aqui pra tu ver…”. Na fila do embarque, dei passagem para um casal de velhinhos com passaportes venezuelanos, embora o homem carregasse uma bolsa da Marinha panamenha. Aí, você é gente boa e o que o mundo (e Murphy) te dá em troca? Ele te dá o velhinho sentado no lugar que deveria ser ocupado por você, o assento 15D. E aí, como faz para dizer em espanhol – e educadamente – “Esse é meu lugar”? Então emendei um “Please, este es mi lugar”, mostrei a passagem a ele e só então ele entendeu e mudou de lugar.

Oreo

Só daqui a cinco meses eu vou poder reclamar de uma decolagem, portanto, vou me dar o direito de reclamar de mais essa. Sofri com a decolagem em Fortaleza, também em Brasília, mas na Cidade do Panamá foi especialmente aterrorizante, porque era a última, então as merdas todas poderiam estar reservadas para ela. Mas, mais uma vez, correu tudo bem. “Acima das nuvens, o tempo é sempre bom”, né Pato Fu? É o momento em que a comissária começa a passar com a comida, e eu percebo que está tudo bem. Foi a melhor comida de avião que já provei. Um sanduíche de carne com picles, Coca-Cola (sempre) e de sobremesa o biscoito mais gostoso de todos os tempos, o melhor amigo do leite, como diz seu slogan: Oreo. E você pode pensar que é um Negresco com outro nome, mas não, o Negresco está para o Santos como o Oreo está para o Barcelona.

La Inmigración

Tendo aterrissado, a vida volta ao normal. Embora a velhinha ao meu lado, esposa do velhinho que estava no meu lugar a princípio, tenha segurado muito forte no braço da poltrona enquanto o avião passava balançando como um avestruz assustado pelas nuvens cinzas que cobriam Medellín. “Gracias por preferir Copa Airlines”. Agora a imigração. Tensão demais, porque eu não entendia nada do que o agente estava dizendo. Ele olhava pro meu passaporte, depois pro colega dele, depois pra mim, falava, falava, e eu sem saber se me preocupava ou se sorria. Quando ele olhava pra mim e falava eu dizia “Sí, sí, claro”. Mas eu nem sabia qual era a pergunta, ou se sequer era uma pergunta. Então ele me devolveu o passaporte e o formulário de imigração que eu havia preenchido no avião e me disse algo que parecia importante. Aí não deu simplesmente pra enrolar, então “Could we speak in English?”, eu disse, e os dois homens disseram em uníssono: NO! Nesse momento eu pensei que eles iam me colocar naquelas salinhas e me perguntar muitas coisas que me deixariam nervoso e que me complicariam, mas disseram apenas um Bienvenido meio emburrado e apontaram a direção que eu deveria tomar.

As bruxas

bruxas

Passado esse momento tenso – embora seja raro o momento em que não esteja tenso – cheguei definitivamente à Colômbia. Troquei os reais que tinha por pesos colombianos e então esperei a Karol Cano ir me buscar no aeroporto. O detalhe é que nós tínhamos marcado às 16h, mas por causa da minha confusão com o fuso horário, lá estava eu no aeroporto às 13h05. No tédio da espera, decidi conferir cada bolso da calça e do casaco. No bolso esquerdo do casaco encontrei a fitinha de Nosso Senhor do Bonfim, que há menos de doze horas estava no meu braço direito. Coloquei a fita no braço no dia da minha despedida no Teresa & Jorge. Fiz os pedidos na vibe do Sancho Pança: “Eu não acredito em bruxas, mas que elas existem, existem”. Agora estou mais inclinado a acreditar que “las hay” mesmo, porque dois dos pedidos eram que o visto desse certo e que eu chegasse em segurança. E pelo fato de que eles tenham se realizado, eu até dispenso o terceiro, que, na verdade, nem lembro mais o que é.

Deixe um comentário

Escrito por Filipe Teixeira

Escritor amador e ansioso profissional.